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Caminhos para a construção de uma experiência de aprendizagem significativa

Caminhos para a construção de uma experiência de aprendizagem significativa

Maio 18, 2021

Caminhos para a Construção de uma Experiência de Aprendizagem Significativa

A principal característica para a construção de um ambiente coletivo e de confiança é a ampliação de um processo de conversação com os alunos.

Sempre que me perguntam sobre as aulas remotas, minha resposta envolve não uma explicação sobre como as aulas estão indo, mas sobre o sentimento que tenho toda semana quando preparo minhas aulas. Esses sentimentos me levam a questões como: o que posso fazer para que essa aula tenha oportunidades de aprendizado que não teríamos no ambiente presencial? Como ampliar o engajamento e a confiança dos alunos no processo de aprendizagem mesmo nos espaços remotos?

Questões como essas me acompanham desde o inicio de março de 2020, quando iniciamos essa trajetória que agora chega a mais de um ano com atividades remotas. Nesse período tive a oportunidade de interagir com turmas de mestrado e doutorado, com turmas de graduação, com alunos de especialização, com turmas pequenas, com turmas grandes, com alunos de diferentes semestres, com alunos em diferentes partes do Brasil. As ideias que compartilho aqui nascem dessa experiência, que tem se desenvolvido em um contínuo esforço de buscar algo único em cada aula, algo transformador para mim e para os alunos, algo que nos inspire e nos conecte de tal forma que tenhamos um autêntico sentimento e interesse pela próxima aula, pelo próximo encontro. Cabe dizer que os pontos que apresento não são um guia, tão pouco o resultado de pesquisas abrangentes sobre o tema. São a essência do que aprendi nesse período, interagindo com os alunos a cada aula.

  1. Compromisso coletivo com a preparação: o espaço da sala de aula virtual não é propício para uma atividade com foco em conteúdo, com longa duração. Aulas expositivas longas, com mais de 30 minutos, acabam cansando os alunos e trazendo para a pauta o questionamento: por que precisamos de aulas assim, síncronas? Dessa forma, é importante construir com os alunos um acordo que envolve a leitura prévia de textos, o acesso a vídeos, entre outros materiais, os quais podem prepará-los para um bom debate em aula. O espaço síncrono é um espaço de construção coletiva do conhecimento, e isso ocorre na operação dos conteúdos, nas trocas, nos comentários e na abertura para o novo.
  2. Construção de atividades coletivas, colaborativas e com sentido para todos. O compromisso com a preparação descrito no item anterior pode estar acompanhado de uma construção sobre os formatos mais interessantes para os alunos discutirem os temas em aula. Isso pode envolver, por exemplo, júris para defender ou atacar o ponto de vista de um autor, exercícios de aplicação teórica em contextos diferentes dos tradicionais (música, séries, filmes), entre outras possibilidades. Além disso, boa parte do espaço de aula deve ser construído para a interação coletiva, a partir do tema apresentado pelo professor.
  3. Conteúdo também importa. A entrega de conteúdo, atividade clássica de nossa ação como professores, é fundamental. Dessa forma, a apresentação pode animar um debate, ou sintetizar o debate. No processo de construção da atividade síncrona, do encontro, o professor pode intercalar esses espaços e debate com sua fala de conteúdo, sempre respeitando um tempo limite, de 20 a 30 minutos.
  4. Queremos estar juntos. Especialmente no contexto da graduação os estudantes sentem falta de momentos para conversar aleatoriamente com os colegas, em grupos menores. Nesse sentido, cabe avaliar a possibilidade de criar, especialmente no início da aula, um espaço livre, de diálogo, de 15 minutos, para que possam falar sobre a semana, sobre o que tem acontecido, suas preocupações, entre outras questões. Esses espaços aumentam a sua confiança nos pares e a abertura para uma debate mais autêntico e colaborativo.
  5. Não acredito que vou ter aula com ela. Além do planejamento do assunto/tema da aula, que envolve a preparação, debate e entrega do professor, ilustrar esse tema com casos e convidados é fundamental. Uma estratégia possível em contexto remoto é convidar para cada aula alguém que possa contribuir com o processo de aprendizagem dos alunos e despertar interesse pelo debate. Podemos convidar professores do curso, especialmente nos casos de mestrado e doutorado, os quais podem comentar ou debater sobre suas pesquisas. Na graduação, podemos convidar ex-alunos, ou mesmo empreendedores, profissionais do mercado, ativistas, que podem estar em qualquer lugar do mundo.
  6. Criando uma conversa. Um dos pontos principais em termos de dinâmica de sala de aula remota não envolve especificamente uma atividade lúdica, uma atividade de aquecimento, ou mesmo um processo de gamificação. A principal característica para a construção de um ambiente coletivo e de confiança é a ampliação de um processo de conversação com os alunos. Alice Kolb define esse processo como conversational learning, o qual envolver um espaço de aprendizagem (físico, remoto, virtual) onde existe respeito, segurança e interesse coletivo para a troca e construção do conhecimento. Nós, como professores, devemos identificar as dinâmicas, formatos e possibilidades em sala, para construir esse espaço. Para construir essa conversa.
  7. Projetar sempre – somos professores, somos projetistas. Nossa atividade de sala de aula é uma atividade de projetação. Devemos construir um processo interagindo com os alunos, para que contemple as particularidades daquele grupo. O processo de projetação envolve a dinâmica da aula, e também as atividades antes e depois do encontro síncrono. Esse espalhamento da nossa atividade, antes circunscrita ao momento no espaço fisico, e a cobrança dos alunos sobre leituras e trabalhos entregues, se consolida em espaço e tempo diferentes, onde as interações, conexões, relações se constroem do primeiro ao último dia de aula, com momentos singulares e significativos, como o encontro, mas que não se resumem no encontro síncrono.
  8. Encontrar as ferramentas corretas. Durante os anos de 2020 e 2021, identificamos um número gigante de possibilidades que incluem ferramentas, plataformas, jogos, entre outras. No início, aprendemos a utilizar algumas destas tecnologias e fomos recebendo dicas de colegas, de alunos, sobre possibilidades para tornar nossa aula mais interessante. Depois de algum tempo, conseguimos identificar um conjunto menor de ferramentas que fossem adequadas para situações distintas. Dessa forma, é importante incluir no processo de planejamento ferramentas intuitivas e adequadas para aquele contexto. Quando vamos projetar em grupo, por exemplo, ferramentas como o Miro são bastante úteis, pois promovem uma interação fácil em boards de projeto que se aproximam das possibilidades físicas.
  9. Codocência. O processo de codocência é uma prática consolidada em diferentes espaços escolares, mas pouco utilizada no ensino superior. Trabalhar com outro professor em sala pode ser importante para iniciar um diálogo, construir um contraponto, iniciar um bom debate que deve ser desenvolvido sempre com a inclusão dos alunos, pois caso contrário se transforma em um processo de afastamento do coletivo.
  10. Autoconhecimento. O décimo elemento para a construção de experiencias significativas na sala de aula é o autoconhecimento. Como professor, precisamos compreender quem somos, nossos pressupostos, preconceitos, limites, para que possamos construir o melhor espaço para nossos alunos. Essa questão é fundamental especialmente quando falamos em segurança e respeito nos espaços de aprendizagem. Quando não nos conhecemos, as nossas fragilidades e vulnerabilidades podem ser limitadores. Quando somos concientes de quem somos, esse processo se inverte e estes limitadores podem se transformar em caminhos que nos aproximam dos outros, que criam diálogo, que promovem reflexão. Essa é provavelmente uma das competências mais importantes que precisamos desenvolver como professores, para nos afastarmos de alguns efeitos negativos que o conhecimento aprofundado e experiência podem trazer, como a prepotência e a falsa compreensão de que não temos mais nada para aprender. Se autoconhecer envolve compreender nossas vulnerabilidades, compreender nossa essência, e principalmente compreender como nos construímos como pessoa humana integral.

Esses 10 aprendizados se inter-relacionam no espaço de sala (fisico ou virtual) e no tempo (antes, durante e após o encontro), e podem ser um caminho para a promoção de aprendizagem significativa no ensino superior. Entretanto, um dos desafios que temos hoje em dia é ampliar o impacto destas ações considerando o conceito representado pela sigla DEI – Diversidade, Equidade e Inclusão.

Um dos principais gargalos que temos em nosso país é o acesso à tecnologia, internet e computadores, para a promoção da educação. Da mesma forma, atividades mais disciplinares promovem a construção de inovação para um grupo, que na maioria das vezes é muito próximo em termos de raça, sexo e classe social. Ampliar o acesso, construir um espaço coletivo com equidade e diversidade são desafios para os gestores de escolas e universidades, em um contexto de educação remota. Precisamos avançar nestes espaços para que as experiências e práticas de sucesso possam impactar a maioria das pessoas, e não os mesmos grupos historicamente privilegiados.

Autor: Prof. Dr. Gustavo Borba

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