As Subjetividades
Midiáticas

 

 

“Por que e para que temos nos tornado compatíveis com tais aparelhos [mídias digitais]?”

Essa questão é crucial para compreendermos as mudanças nas subjetividades e nos processos de subjetivação que estão em funcionamento em sociedades como a nossa, mediadas por tecnologias digitais. Ajuda-nos, também, a pensar as condições anteriores de constituição dos sujeitos. Esse exercício de fazer a “história do presente” é um caminho para construirmos possibilidades de trabalho junto às crianças e jovens de nosso tempo.

Assista à palestra da pesquisadora Paula Sibilia, disponível em:

Parte 1: https://www.youtube.com/watch?v=us2ZiXBnwps

Parte 2: https://www.youtube.com/watch?v=oPAVLBDegBM

Parte 3: https://www.youtube.com/watch?v=5iv7njgNbTQ

Na sequência, seguem alguns excertos do capítulo intitulado As Subjetividades Midiáticas Querem se Divertir, presente no livro Redes ou Paredes: a escola em tempos de dispersão (SIBILIA, 2012).

 

 

Diversão verso Opressão

  • “Muitos discursos atuais, inclusive os mais oficiais, parecem coincidir num ponto: aos alunos do século XXI é necessário oferecer diversão. Isso é bem diferente do que acontecia com os “oprimidos” de alguns anos atrás, aos quais era preciso emancipar, libertando-os do confinamento alienante e do julgo disciplinar por meio das asas da alfabetização. O que não significa, é claro, que a opressão ou a alienação tenham sido erradicadas – nem sequer o analfabetismo o foi –, particularmente na América Latina, mas sim que nosso drama histórico tem se redefinido nas últimas décadas”. (SIBILIA, 2012, p. 81).

    Nesse ponto, Sibilia (2012) compara as demandas atuais por diversão com as lutas contra às formas de opressão que limitavam a liberdade dos sujeitos na década de 1960 e que se estendem, em parte, até hoje. Faz, aqui, referência direta à obra de Paulo Freire intitulada Pedagogia do Oprimido.

  • “Os jovens de hoje pretendem que as aulas sejam divertidas, o que evidencia certa defasagem entre duas formas diferentes [diversão e opressão] de o sujeito se relacionar consigo mesmo, com os demais e com o mundo”. (SIBILIA, 2012, p. 81).

    “É claro que não são novas as tentativas de atualizar a educação formal para torná-la mais prazerosa e eficaz. Ao longo do século XX, a didática tentou introduzir os jogos nas salas de aula, por exemplo, no intuito de aliviar certa carga associada ao fatigante trabalho escolar, potencializando a aprendizagem de um modo divertido. No entanto, esses usos pedagógicos do lúdico pretendiam submetê-lo a objetivos mais transcendentais que o mero fato de divertir o alunato: o importante era aprender algo, ainda que se preocupasse consegui-lo por meio desses recursos inovadores, que retiravam um pouco da antiga seriedade das clássicas disciplinas colegiais. (SIBILIA, 2012, p. 82).

  • “Agora, ao contrário, quando o entretenimento – ou até mesmo o espetáculo – generalizou-se como uma modalidade privilegiada de relação com o mundo e, ao mesmo tempo, vem se esgotando o ideal da educação como uma transfusão de conhecimentos de um polo que sabe para outro que não sabe, as coisas mudaram”. (SIBILIA, 2012, p. 82)

    “Essas crenças se dissiparam como os deslocamentos ocorridos nos últimos anos. Desde então, são infinitas as propostas didáticas que tentam atualizar a escola, incorporando não só as brincadeiras e a diversão, mas também as diversas mídias: desde o jornal e o cinema até a televisão e a internet”. (SIBILIA, 2012, p. 83)

  • “A televisão atual difere muito daquela que alimentou a subjetividade dos que hoje têm mais de quarenta anos, por exemplo, porque os usos que ela suscita são outros; portanto, a criança contemporânea que vê televisão difere daquela que se sentava na frente do televisor há um par de décadas.

    Já não se trata de observar, escutar, receber e interpretar mensagens enquadradas em gêneros específicos e bem definidos – além de ordenadas conforme o ciclo de princípio, meio e fim –, transmitidas de maneira estável e sem mediação do controle remoto, com horários preestabelecidos e emissão claramente descontínua”. (SIBILIA, 2012, p. 84)

  • “Em sintonia com a banalização e a saturação imagética, as palavras também não amarram nem decantam, não chegam a consolidar significados em quem as profere nem em quem as escuta: em vez ancorar experiências com seu peso capaz de marcar corpos e subjetividades, elas patinam ou deslizam sem se prender a nada, como opiniões intercambiáveis que se soma à maré e desaparecem, em vez de lhe dar espessura fazendo-a se deter ou interrompendo seu devir. Em seu excesso sem densidade, tanto as imagens como as palavras se mostram impotentes para desacelerar esse fluxo ou para lhe dar coesão: não conseguem se condensar em diálogo nem em pensamento”. (SIBILIA, 2012, p. 86)

    Acontece que a própria linguagem se torna inconsistente quando a opinião substitui o pensamento e a informação ocupa o lugar do saber ou do conhecimento: sobrevém a impressão de vazio, pois a palavra não produz nenhum retraimento, não modula a interioridade necessária para se poder pensar”. (SIBILIA, 2012, p. 86-87)

A partir desses excerto da obra de Sibilia (2012), qual alternativa não condiz com os apontamentos da autora?

Escolha uma das alternativas abaixo:

a. Ter opinião sobre tudo não exige do sujeito refletir e aprofundar as questões;

b. Acessar informações e opinar sobre determinado tema são competências que a escola precisa desenvolver;

c. Ter acesso às quase infinitas informações disponibilizadas pelas Novas Tecnologias Digitais não significa que os sujeitos estão mais apropriados de certas questões;

d. O exercício do pensamento e a construção de conhecimento sofrem, hoje, profundas alterações em razão da velocidade e superficialidade características da opinião da saturação de informações.

Alternativa correta: b.

  • “O espectador contemporâneo não seria, portanto, exatamente um receptor – aquele que decodifica, critica ou se deixa alienar –, mas um usuário que surfa ininterruptamente no caos das informações”. (SIBILIA, 2012, p. 87).

    “[...] Hoje, sofre-se por saturação e por dispersão, pois todo o aparato sensorial está ocupado e foram entupidas as brechas capazes de catalisar a experiência”. (SIBILIA, 2012, p. 88)

    “A escola sempre procurou transformar a criança num aluno interessado, atento e aplicado. Com essa meta, a subjetividade estudantil se edificava a partir de práticas que instituíam a memória, a atenção e a consciência, buscando fazer com que esta última exercesse hegemonia sobre a percepção”. (SIBILIA, 2012, p. 89)

  • “O que o mantém sintonizado nessa vivência não é o sentido do que observa, e sim a própria aceleração. Quando a saturação chega a certo nível de esgotamento, ele [o aluno, o sujeito contemporâneo em geral] se entedia e se desliga”. (SIBILIA, 2012, p. 90)

    “Aparentemente opostas, portanto, a apatia e a hiperatividade seriam dois efeitos complementares da saturação contemporânea: resultados do contato com um meio evanescente em que tudo acontece vertiginosamente, sem deixar marcas”. (SIBILIA, 2012, p. 91)

  • “A saturação total impede de pensar e de agir. Por isso é tão vital resistir ao fluxo mediante estratégias de fixação, algo que a escola contemporânea deveria assumir como um dificílimo compromisso. Seja como for, o que vier a acontecer só ocorrerá nesse ambiente hiperestimulado e hiperestimulante, porque esse é o contexto no qual vivemos. Portanto, não se trata de verter todas as energias na tentativa e bloqueá-la ou isolar-se, mas de tentar algo muito mais complicado e interessante: conceber modos de subjetivar, pensar e dialogar nessas condições”. (SIBILIA, 2012, p. 91-92)

Após assistir à palestra de Sibilia e acompanhar os apontamentos do livro Redes ou Paredes, precisamos refletir se é possível “pensar em tempos de dispersão”.

 

 

Referência bibliográfica

SIBILIA, Paula. Redes ou paredes: a escola em tempos de dispersão. Rio de Janeiro: Contraponto, 2012.

 

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