Segunda conferência do Fronteiras do Pensamento 2023 recebeu Nadia Murad

A iraquiana vencedora do Prêmio Nobel da Paz 2018 falou sobre como navegar num mar de incertezas

Crédito: Robinson Aronis

A 17ª edição do Fronteiras do Pensamento tem como tema principal “Entre o caos e a ordem” e ocorre presencialmente em São Paulo e em Porto Alegre. Nesta quarta-feira, 21 de junho, foi a vez de Nadia Murad estabelecer um diálogo com o público de Porto Alegre, no Teatro Unisinos. A conferência “Que eu seja a última”, mesmo nome do livro de Nadia, trouxe, dentre muitos elementos, um panorama instigante sobre a luta por justiça e direitos. O evento foi mediado por Fernanda Bragato, professora de Direitos Humanos da Unisinos. 

Nadia tem 30 anos e hoje trabalha na defesa dos sobreviventes de genocídio e violência sexual. Após uma breve introdução, ela contou como viveu a violência extrema decorrente dos conflitos motivados pelo Estado Islâmico, simplesmente por ser yazidi (comunidade religiosa que é muito perseguida por ser considerada “infiel”). E sobre como aprendeu a agir para que as coisas começassem a mudar após sair da condição de escravidão em que se encontrava.

Crédito: Robinson Aronis

“Quando fui libertada, sim, eu estava aliviada, mas o luto, o caos e a incerteza conviviam comigo. Eu não tinha a capacidade de ter minhas próprias decisões. Meu lar estava destruído e eu não tinha ideia do que viria no futuro”. A ativista dos direitos humanos diz que as situações, na perspectiva de quem não as vive, são “fáceis de ignorar e esquecer. As coisas estão acontecendo no seu país, na sua cidade”.

A relação com a mãe 

Não apenas Nadia, como toda sua família sofreu nas mãos do ISIS. “Minha mãe era uma mãe solteira. Conseguiu criar 11 filhos sem nada. Com ela, eu aprendi o que era ser mulher, especialmente num país como o Iraque.  Ela foi morta no meio do dia com a irmã. Depois disso, comecei a pensar no que ela fez por mim e o que eu poderia fazer para legitimar o legado dela”. Além da mãe, seis irmãos dela foram vítimas de um dos diversos genocídios ocorridos no país. 

Depois da fala, Nadia, que é embaixadora da Boa Vontade da ONU para a Dignidade dos Sobreviventes de Tráfico Humano das Nações Unidas, respondeu a perguntas da plateia. Uma das questões foi “Que mensagem você poderia deixar para as mulheres indígenas no Brasil, em vista da violência a que elas e seu povo estão sendo submetidas?”. Ela responde: “Como eu disse para as sobreviventes na Ucrânia, vocês não estão sozinhas. A documentação é a chave. Que vocês continuem documentando e falando umas com as outras, toda evidência será necessária na justiça”.

Crédito: Robinson Aronis

“Até agora, ninguém no Iraque se desculpou comigo ou com algum dos sobreviventes. Nada foi feito para prevenir que aquilo acontecesse. Nós sabemos que há sinais e temos que agir antes que seja tarde. Precisamos agir quando vemos sinais de conflito”.  

Estratégia para ganhar corações e mentes  

Outra indagação envolveu a necessidade de atingir grandes públicos com uma mensagem importante, questionando sobre como fazer isso. Nadia indica uma estratégia: “Pensem sempre em atingir alguém próximo a você, não a públicos maiores. Comece com sua família, amigos, escola, comunidade. Isso é muito mais importante do que falar com grandes multidões”.

A jornada de Nadia  

Você pode conferir mais sobre a jornada de Nadia e até mesmo contribuir com doações por meio da iniciativa dela, a Nadia’s Initiative.  

Ao final do evento, foram distribuídos autógrafos para quem possuía o livro da convidada, intitulado “Que eu seja a última: Minha história de cárcere e luta contra o Estado Islâmico”. Ela agradeceu muito pela oportunidade de estar no Brasil e disse que foi interessante ver como as pessoas daqui são fortes. “Meus irmãos sempre falavam do Brasil, víamos os jogos de futebol juntos. Eles não estão aqui para me ver hoje, mas ficariam orgulhosos”.

Crédito: Robinson Aronis

Fronteiras vai até outubro 

Esta foi apenas a segunda conferência do evento. O Notícias Unisinos esteve presente na primeira noite, que contou com a jornalista espanhola Rosa Montero. A matéria você encontra aqui. Presencialmente, ainda serão recebidos o neurocientista norte-americano David Eagleman, em 5 de julho; no dia 9 de agosto, o filósofo norte-americano Michael Sandel; o documentarista norte-americano Douglas Rushkoff, no dia 13 de setembro; e, para encerrar a temporada, no dia 4 de outubro, o arqueólogo britânico David Wengrow.

 

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