A discussão sobre gênero, sexualidade e identidade se intensificou no final do século 20. Em conexão a esses temas cada vez mais em voga, há uma questão que merece destaque por evidenciar a vulnerabilidade das pessoas envolvidas: a violência que decorre do gênero. A esse assunto a revista IHU On-Line, do Instituto Humanitas Unisinos, dedica a edição 507.
Quando se fala em gênero e violência, a associação imediata é a mulher como vítima e o homem como agressor, em razão da histórica opressão que elas sofrem. Há também outros segmentos que se apresentam sob risco a diversas formas de preconceito e de desrespeito à diversidade, por exemplo, pessoas LGBTs.
O debate ora proposto inicia-se com um artigo do jornalista Gabriel Galli e do psicólogo Ramiro Figueiredo Catelan acerca dos equívocos e das disputas que incidem sobre conceitos em constante transformação. Os autores reconhecem que se, por um lado, “é obrigação de quem pretende se posicionar sobre um assunto buscar informações sobre ele, por outro, é bastante difícil se manter atualizado acerca das constantes mudanças em torno do tema”. O texto é complementado por um oportuno glossário.
A primeira entrevista é com a professora e blogueira Lola Aronovich, que se tornou uma referência na internet para milhares de mulheres em temas relacionados a feminismo. A popularidade, a contundência e a natureza de seus textos despertaram muito ódio, tanto que ela foi alvo de mentiras e ofensas, além de ameaçada de estupro e morte. Mas não se calou, mesmo que várias vezes tenha pensado em parar.
O assistente social Guilherme Gomes Ferreira trata do sistema prisional, ambiente onde as violências motivadas por gênero são potencializadas, o que resulta em agressões para mulheres, travestis, pessoas trans e gays. A professora Jane Felipe de Souza defende que qualquer tema seja discutido em aula, incluindo gênero, sexualidade e respeito à diversidade, pois nem sempre as famílias conseguem lidar com todos os assuntos, mas essa perspectiva gera reações contrárias.
Para a feminista negra Juliana Borges, não se pode pensar em políticas públicas sem o devido recorte racial. Ela afirma que violência é fruto do sexismo e não se pode indissociá-la do racismo, quando a maioria das mulheres que sofrem agressões são negras.
Para o professor e psicólogo Adolfo Pizzinato, não há dúvida de que a violência de gênero deveria ser eliminada ou radicalmente transformada. “Porém, a forma que propomos de contribuir para o debate é ir além de atrelamentos dicotômicos, tais como: bom-mau, homem-mulher, agressor-ofendida.” O também psicólogo e professor Ângelo Brandelli Costa destaca que “é fundamental reconhecer discriminação contra diversidade como violação de direitos” e que a representação social negativa e a demarcação das sexualidades não heterossexuais como diferentes, anormais e negativas são matriz do preconceito.
Alinhado ao tema desta edição, o crítico de cinema Fernando Del Corona analisa o documentário Laerte-se, de Eliane Brum e Lygia Barbosa da Silva, que expõe o lado vulnerável da cartunista Laerte, que vive fortemente sob os holofotes nacionais desde que assumiu sua identidade de mulher trans no final dos anos 2000.
Completam a edição as entrevistas com o Kaingang Josme Fortes, estudante de Pedagogia, que aposta na garantia e no acesso à educação como fortalecimento dos integrantes de sua aldeia e de seus modos de vida; com o professor Alain Naze, que analisa perspectivas em comum nos pensamentos de Pier Paolo Pasolini e Walter Benjamin; e com o doutor em Sociologia Tiaraju D’Andrea, que analisa as principais transformações ocorridas na periferia paulistana em duas décadas e meia, e com Antônio Carlos Rafael Barbosa, professor da Universidade Federal Fluminense – UFF, que analisa a estrutura dos coletivos de crime que se instalam nas periferias.