Estudo observa relações entre mulheres e artesanato

Professora Edla Eggert, da Escola de Humanidades Unisinos, estuda gênero e arte popular em pesquisa de pós-doutorado, no México

A experiência de fazer um pós-doc traz conquistas muito importantes para a vida profissional do pesquisador que tem a chance de se lançar nesta aventura. A oportunidade de realizar um estágio pós-doutoral acontece em um momento em que há maturidade acadêmica, aliada a um maior tempo para refletir sobre as questões analisadas.

Neste clima de efervescência de conhecimento, que a professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Unisinos, Edla Eggert está vivendo, desde fevereiro de 2014, quando rumou para o México, a fim de realizar um pós-doc na Universidade Autônoma Metropolitana. “Um pós-doutorado é tempo de repor energias, fazer estudos que ficam para trás”, ressalta.

O tema que impulsiona o projeto de Edla está ligado às questões de gênero. O trabalho enfoca A Arte Popular e as Mulheres: um estudo conceitual da tecnologia artesanal, e encontra terreno fértil nos vilarejos mexicanos. “Percebo a importância da área da Educação pesquisar a formação da mão de obra desse segmento não somente em nível brasileiro, mas latino-americano”, destaca.

A pesquisa está alicerçada em importantes referências como os textos de Álvaro Vieira Pinto e Victória Novelo. Com retorno previsto para julho, enquanto a viagem de estudos não acaba, Edla fala das proximidades e diferenças entre o Brasil e o México. “Em comum temos um povo muito trabalhador, alegre, receptivo e que ajuda, na maior parte das vezes, quem não é mexicano”, conta.

“ Um pós-doutorado é tempo de repor energias, fazer estudos que ficam para trás.”

Edla Eggert, professora da Unisinos

Como surgiu a vontade de fazer um pós-doc?

Eu li, há 8 anos, o livro da professora Eli Bartra “Criatividad invisible – Mujeres y Arte Popular en América Latina y Caribe” na literatura que tenho trabalhado com base em minhas pesquisas sobre a formação das artesãs no Brasil. A partir de então, fiz contato com ela e passamos a nos corresponder, e aos poucos, conseguimos estabelecer algumas relações entre as pesquisas dela e as minhas. E desse modo, fizemos um convênio entre as duas universidades (Unisinos e UAM). No ano passado, no mês de julho, organizamos uma jornada de trabalho e convidando a professora Eli como docente e avaliadora de uma proposta de tese de uma orientanda minha, Amanda Motta Castro. Ainda no ano passado essa doutoranda veio para a UAM por meio de um intercâmbio com bolsa da Capes, de doutorado sanduíche.

Por que a escolha pelo México e pela Universidade Autônoma Metropolitana?

O México é um país envolvente! Complexo, como todos os países do mundo. Já havia estado aqui duas vezes e me encanta a língua, o artesanato, a cultura das grandes civilizações mesoamericanas. E pelo fato de a professora Eli ser docente numa das universidades da Cidade do México, num Programa de Ciências Sociais, que possui um Mestrado em Estudos de Gênero há 30 anos, do qual essa docente é fundadora.

Quais as principais descobertas que a pesquisa trouxe?

Um pós-doutorado é tempo de repor energias, fazer estudos que ficam para trás, como no meu caso, que fiquei três anos na coordenação do Programa de Pós-Graduação em Educação. Estou lendo bastante, autores já assinalados há algum tempo, como Alvaro Vieira Pinto e seu livro sobre o Conceito de Tecnologia, que me fazem pensar sobre a técnica, a arte e tecnologia, como ação humana no trabalho. E nesse caso, um trabalho realizado por uma maioria de mulheres. Ler e conhecer autoras como Victória Novelo – que por uma incrível coincidência é professora da Universidade Autônoma do México, pesquisadora no campo da antropologia junto à luta de sindicatos de trabalhadores de várias categorias e entre esses trabalhadores estão as e os artesãos – é um privilégio.

Entre as muitas novidades, descobri pessoas interessadas em temas que, às vezes, parecem nada, mas que na verdade é a vida de trabalho de uma imensidão de pessoas. Aqui no México a arte popular e o artesanato são tão ricos quanto no Brasil, e até mais eu diria. Nesse país, assim como na Guatemala, Peru e Colômbia, temos registros de arte popular que se desdobram nos trabalhos artesanais dedicados de artífices com longa tradição familiar. Percebo a importância da área da Educação pesquisar a formação da mão de obra desse segmento não somente em nível brasileiro, mas latino-americano.

Culturalmente, o que o México tem em comum com o Brasil?

Essa pergunta é bem difícil de ser respondida, pois num primeiro momento podemos achar que temos muitas coisas em comum, mas um pouco mais de tempo aqui e vemos que não chegamos nem perto. Há coisas como o futebol que poderíamos dizer que se parecem, inclusive nas “trampas” administrativas, tipo CBF etc e tal. Em comum temos a realidade de país colonizado e que se recoloniza de muitas e distintas formas: como uma polícia truculenta. Mesmo que aqui não tenha havido ditadura, os mexicanos também viveram seus duros anos de 1968, com muita repressão e seguem vivendo a questão do narcotráfico. Em comum também temos um povo muito trabalhador, alegre, receptivo e que ajuda na maior parte das vezes quem não é mexicano.

E quais as principais diferenças?

Diferente? Temos a comida! Impressionantemente diferente. E gostosa! Tenho provado deliciosos “desayunos”. Diferente também é a história do povo mesoamericano. E o mais espantoso é o nosso desconhecimento de tudo. Não temos a mínima noção das culturas originárias, das migrações, dos tempos, dos espaços. Enfim, uma geografia e uma história que nos são absolutamente surrupiadas como continente americano que somos! Aqui se diz muito que os mexicanos são feitos de milho, mas eu acrescentaria que são feitos de pedra! Os sítios arqueológicos que já visitei Monte Alban (Oaxaca), Theotiuhacan (México) e Tajin (Veracruz) demonstram a pujança de desenhos e pirâmides feitos com as pedras. Como conseguiram fazer tanta beleza na aridez das pedras? Com certeza uma tecnologia que ainda está por ser compreendida por nós, que achamos que estamos no tempo da tecnologia!

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