“O papel do professor mudou. Deixou de ser focado no ensino, na transmissão da informação, para ser focado no compromisso com a aprendizagem”, afirma Daiane Grassi, que será palestrante do TEDxUnisinosSalon, no dia 26 de junho. Daiane é formada em Pedagogia e acredita no ensino criativo aliado às tecnologias digitais. Em suas aulas, busca atuar sempre ao lado dos estudantes, em um processo colaborativo. E alerta: “Inovar dá trabalho”.
O TEDxUnisinosSalon será uma preparação para o tradicional evento TEDxUnisinos. Com o tema Sonhos e Conexões, a primeira edição acontecerá na sexta-feira, 26 de junho, das 10h às 11h30 na sala Santander, no campus Porto Alegre.
Que relação você percebe entre as áreas de educação, tecnologia e processos criativos?
Nós estamos vivendo em um contexto de muitos estímulos, muita informação, em que tudo é interativo, tudo é participativo e quase tudo é mais interessante do que a sala de aula (a televisão, o celular, o tablet, o furby da criançada…). Dessa forma, é preciso perceber para além daquilo que se vê, com outros olhos. Atuar de forma criativa. E criatividade não é um dom para poucos, qualquer um pode ter. No entanto, é preciso exercício, estudo, experimentação, mexer com zona de conforto, dedicação, técnicas, métodos e processos. Por isso, processos criativos.
A relação entre educação, tecnologia e processos criativos está justamente em utilizar as tecnologias de forma criativa e que dê sentido ao processo de aprendizagem do aluno. Caso contrário, estaremos apenas substituindo o caderno cheio de “conteúdos” pelo tablet também cheio de conteúdos. O que não nos adianta.
O que significa design de aprendizagem baseado em empatia, colaboração e experiência?
Design de aprendizagem não significa deixar a aprendizagem mais bonita e alinhada. O design que aqui refiro é design no sentido de projetar algo. Projetar situações de aprendizagem. O papel do professor mudou. Deixou de ser focado no ensino, na transmissão da informação, para ser focado no compromisso com a aprendizagem. E, quando a gente pensa em desenhar situações para que o aluno aprenda, impreterivelmente precisamos saber como algo faz sentido para ele (empatia, se colocar no lugar do outro), construir juntos (colaboração) as rotas de aprendizagem (aprendizagem personalizada) e experiência (testar hipóteses).
Enquanto educadora, como você aplica a informática em sua dinâmica de ensino? Que resulta dessa prática, em termos de aceitação por parte dos alunos?
Em todas as minhas aulas, utilizo um ambiente virtual que dê suporte para as questões de sala de aula presencial. Algumas instituições já disponibilizam esses ambientes para nós, professores. Outras ainda não. Nestas que ainda não disponibilizam, normalmente, os próprios alunos se organizam e criam comunidades virtuais em redes sociais livres e em aplicativos de troca de mensagens. É simples, é orgânico. Faz parte das nossas vidas. É o professor atuando em parceria direta com o estudante. É muito prazeroso (para mim) receber uma mensagem/recadinho de um aluno (fora de aula) dizendo: “Professora, preciso falar contigo urgente! Tive uma ideia para o projeto”. Isso significa que “rolou” a empatia e que o objetivo de “gerar situações de aprendizado” está dando certo.
Além de ambiente virtual, utilizo em aula tecnologias que permitem produções colaborativas (de texto, de apresentações, de pesquisas), em especial as do Google. Também tenho utilizado as possibilidades de educação híbrida, fazendo uso de MOOCs, tais como o Coursera, nas aulas presenciais.
Há algum tempo, usar tecnologias em sala de aula era, senão proibido, bastante controverso. Isso mudou, está mudando? Como você percebe essa situação no país e, sobretudo, no estado?
Bem, na realidade, desde que eu vi um computador pela primeira vez, logo me apaixonei. Atuo com tecnologias educacionais desde que “me conheço por gente”. Sempre estive inserida nesse contexto, ora de laboratórios de informática de escolas, ora trabalhando com educação a distância. Quando a gente está imerso nesse trabalho, ele parece tão óbvio que não se percebe tanto os obstáculos. Mas, sim… Como atuo bastante também com formação de professores, realmente, a maior questão/obstáculo é o aceite do professor em aprender este “novo”. Às vezes, é mais fácil ficar replicando metodologias consideradas mais tradicionais e que “até dão certo”, do que inovar. Inovar dá trabalho. Mexe com zona de conforto. É difícil para alguns.
Em termos de estruturas (aparelhos/equipamentos), há muitos incentivos. Há muitos projetos. Há muita gente fazendo muita coisa bacana tanto em nível federal quanto estadual. Escolas realizando projetos fantásticos, tanto na rede pública (e temos exemplos disso em campeonatos de robótica e uso de tablets), como em escolas privadas.
Nosso problema maior não tem sido os equipamentos (temos também, mas não vejo como o principal). Mas, sim, a formação de professores. Há algumas escolas com laboratórios equipados, inclusive, com wireless, fechado, por não terem alguém para fomentar o uso. Isso é bem triste. E não são poucas.
O que o Google tem a oferecer aos estudantes?
O Google desenvolve tecnologias. Há uma série de oportunidades de projetos para alunos se engajarem. Mas, tem investido especialmente no desenvolvimento de tecnologia para o professor utilizar com os seus estudantes. O chamado Google for education é um pacote que contém uma sala de aula virtual, um espaço de armazenamento em nuvem (Google Drive) e um pacote de aplicativos para serem utilizados em nuvem também: editores de texto, apresentações, planilhas e formulários (além de milhares de aplicativos e complementos que podem ser instalados nas contas dos alunos). Outras iniciativas, tais como o uso de tablets, chromebooks e os cardboards, também são possibilidades pensadas por eles. As escolas públicas podem usar de forma gratuita o Google for education. As privadas têm um custo.
O grande desafio é a formação de professores. Por isso, também foi criado um movimento global de engajamento de professores, chamado Grupo de Educadores Google. A intenção é fomentar encontros e formações docentes. O programa GEG é novo no Brasil. Fez um ano agora em abril. Aqui em Porto Alegre, o movimento começou em outubro do ano passado, quando tive a oportunidade de conhecê-lo num evento em que fui selecionada para participar na sede da Google em SP (Google Teacher Academy).
Trouxe o programa para cá e, desde outubro de 2014, temos realizado encontros para troca de experiências acerca do uso das tecnologias na educação. Os encontros ocorrem em lugares como Jardim Botânico (para além dos muros da sala de aula), no Nós Coworking, e agora estamos com uma iniciativa “roadshow” de passar por algumas escolas públicas, com oficinas para os professores. Temos um site (“simplinho”, pois todo o trabalho é voluntário e envolve a boa vontade das pessoas), que direciona para as nossas redes sociais: www.gegportoalegre.com.br.
Em que momento esse apelo da tecnologia a tocou? Quando você percebeu que deveria atentar para o lado da informática? Foi em sua formação acadêmica?
Isso foi há algum tempo. Desde a época de colégio, ajudava meus professores a “digitalizar” seus materiais (costumo dizer que foram os meus primeiros ensaios com formação de professores). Mas, na época em que estava terminando o Ensino Médio, meio sem saber para que prestar vestibular, fui participar de uma feira de profissões na PUC/RS e conheci o curso de Pedagogia com Habilitação em Multimeios e Informática Educativa. Foi um curso sensacional que a PUC/RS criou na época e que, agora, em razão da extinção das habilitações da Pedagogia, não existe mais. No curso, nós tivemos várias disciplinas de comunicação, tecnologia e pesquisa em informática na educação. Era uma grade curricular super inovadora. Mesmo tendo me formado em 2004, ainda lembro das aulas e discussões como se fosse hoje. Na realidade, eu acredito que o apelo ao uso da tecnologia veio antes mesmo de eu saber que seria educadora.
O que ainda é preciso melhorar, em termos de estrutura, pensamento etc., para que o uso de tecnologias nas aulas seja comum?
Os professores precisam se dar conta de que não é mais possível competir com o Google no que se refere à “entrega de informações”. Antigamente, fazia sentido o aluno sair de casa e ir para a escola em busca de informação (eu participei disso, passava tardes na escola “copiando a Barsa”). Não tínhamos tecnologia em casa ou em nossos bolsos, como as temos agora. Hoje não faz mais sentido. É preciso melhorar a concepção de educação. Pensar mais em aprendizagem. Em design de aprendizagem.