Interpretar ou apenas sentir uma obra visual normalmente é uma atividade silenciosa, às vezes solitária, que une olhar e bagagem cultural de cada um. Mas isso não precisa ser assim sempre. E se ao reparar em uma pintura, por exemplo, você ouvisse uma música relacionada ao tema? É com esse objetivo, de criar novas sensações, que alunos da disciplina de Comunicação e Arte da Unisinos desenvolveram um projeto que sugere canções para serem ouvidas enquanto se aprecia uma obra artística, com ajuda do Instagram e Spotify.
A iniciativa é inspirada em uma ação da Pinacoteca de São Paulo (#pinadecasa) que une a música aos artistas, movimentos ou tendências do campo das artes visuais. O objetivo, segundo o professor da atividade acadêmica, Everton Cardoso, é sensibilizar os sentidos, como olhos e ouvidos.
Segundo Everton, a pandemia fez com que os professores tivessem que reinventar o modo de realizar suas aulas no formato remoto, com o objetivo engajar os alunos. “Precisei pensar como poderia atrair os estudantes para participar cada vez mais das aulas online, e essa iniciativa tem essa característica”, comenta. Um dos desafios da atividade é a diversidade de cursos envolvidos. São estudantes de Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Fotografia, Comunicação Digital, Bacharelado Interdisciplinar e Administração.
Para começar, cada um escolheu uma obra de um artista contemporâneo. O primeiro deles foi do artista plástico brasileiro Arthur Bispo do Rosário, considerado gênio por alguns e louco por outros. Já o segundo foi o gaúcho Sandro Ka. Depois vieram os artistas internacionais Jeff Koons, Marina Abramovic e Damien Hirst. “Com a obra escolhida, os alunos precisavam encontrar uma música que, por uma razão qualquer, se relacionasse com o trabalho do artista. A partir disso, deveriam fazer uma postagem no Instagram “@com.uni.arte” e adicionar a canção na playlist do Spotify”, explica o professor.
“É o primeiro semestre que realizo este projeto. Nada é certo, mas gostaria de continuar ele nas futuras turmas. No geral, as pessoas têm muito mais facilidade de se relacionar afetivamente com a música do que com as imagens. Por isso, achei que é uma forma bacana de promover uma conexão dos alunos com as obras de arte”, ressalta Cardoso.
Horizontes ampliados
Sandro Ka é um nome adotado no início de sua carreira, há 20 anos. O artista visual nasceu em Porto Alegre em uma família que todos tinham aptidão para desenhar. Sua graduação no Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), de 2002 a 2007, foi nessa habilitação. Porém, foi na associação de diferentes objetos tridimensionais, trabalhando apropriação e justaposição, que formou seu estilo e o alçou a artista conhecido. Para ele, deslocar as imagens ou brinquedos de seu uso genuíno, familiar, provoca sentidos novos.
Sandro foi retratado no projeto. Ele se surpreendeu com os resultados da iniciativa pedagógica. “Pude participar, primeiramente, interagindo com os alunos em uma conversa sobre o meu processo. Na ocasião, a turma pesquisou sobre meu trabalho e fez vários questionamentos. Para minha surpresa, muito do que foi conversado apareceu nas leituras e abordagens sobre os meus trabalhos de forma bastante criativa e potente”, pontua.
Conforme Sandro, o projeto de relacionar seus trabalhos com a música amplia horizontes e exercita outras possibilidade para a escrita criativa. “Acredito no trabalho de arte que acontece justamente nesse encontro de obra com o público espectador. É nesse encontro que a arte se produz, com muitas abordagens e verdades. Cada um vê e lê a partir de suas histórias, conhecimentos e vivências. Oportunizar encontros e trocas como essas é algo muito positivo, tanto pra mim, ao ver leituras tão distintas das obras, quanto para os alunos, que têm uma oportunidade de exercitar suas práticas interagindo com agentes do circuito artístico local”, comenta.
Aprendizado mais prazeroso
O projeto “@com.uni.arte” está sendo realizado por 36 alunos da turma de São Leopoldo e 18 de Porto Alegre. A estudante de Publicidade e Propaganda Gabriela Cristina Blasi, 21 anos, entende que esse método está fazendo com que ela se sinta menos insegura para interpretar uma obra. “Sempre tive dificuldades em estudar e entender o assunto ‘arte’, e confesso que comecei a cadeira com medo. Mas essa técnica elaborada pelo professor tornou mais fácil e acessível o entendimento. Conseguiu aproximar o conteúdo para a realidade de cada aluno e ainda torna o aprendizado mais prazeroso”, comenta.
O estudante de Jornalismo Kévin Sganzerla, 22 anos, também acredita que o mundo da arte ficou mais fácil de entender. “A atividade tornou as análises de obras muito mais fáceis, pois a arte, pelo menos para mim, era distante, mas agora transmudou-se em algo muito próximo ao conseguir dialogá-la com meus gostos musicais”, comenta.
Pra a aluna de Comunicação Digital Jenifer Thais Pagani, 21 anos, misturar arte e música a faz refletir e entender ainda mais sobre as obras estudadas em aula. “A iniciativa começou como uma brincadeira inspirada no projeto da Pinacoteca de São Paulo, e nós nos engajamos muito”, diz.
O êxito da atividade também é compartilhado por Indayá Glória do Amarante, 19 anos, estudante de Fotografia. “Achei a ação muito criativa e estimulante. Nos faz refletir e pesquisar mais sobre a matéria em que estamos estudando e sobre como ela influencia nossa vida e nossas perspectivas daqui pra frente”, avalia.
Para ficar por dentro de tudo que acontece no projeto:
- Instagram: @com.uni.arte
- Spotify: https://spoti.fi/2GpkuBd