Aline Andrighetto [1]
Em curso de processo eleitoral, o Brasil vive grandes impasses por parte de seus candidatos e eleitores. Nos debates que precederam o pleito do último dia 05 de outubro podemos perceber o quanto o discurso preconceituoso está presente na sociedade. Diante de um diálogo intercultural a troca não é apenas entre diferentes saberes, mas entre diferentes culturas, ou seja, entre universos de sentido diferentes. Menciona Boaventura que “o paradigma da modernidade se baseia em uma tensão dialéctica entre regulação social e emancipação social”. Há uma busca constante por emancipação em nosso país, onde esforços pela busca de igualdade de direitos, e o que se percebe é que se mantém o discurso dominante de ódio por parte de alguns candidatos os quais demonstram interesse em confrontar os discursos em defesa de grupos vulneráveis presentes na sociedade brasileira.
A Constituição brasileira de 1988 é considerada um marco jurídico no processo de transição democrática e política, bem como a institucionalização de direitos no país afora citada em muitos debates, sendo até mesmo mencionada como necessária para “manter a defesa da moral e da família brasileira”. Em outro momento, o discurso religioso foi usado para afirmar e garantir o direito ao casamento, em contradição, certo candidato mencionou que “não apoia o casamento civil igualitário, mas uma lei segregacionista de ‘união civil’”. Percebe-se que este candidato colocando-se contra o direito de homossexuais ao casamento civil, mas apoiando uma lei de união de negros é no mínimo incoerente. Segundo Jessé de Souza: “Não é, antes de tudo, um preconceito de cor, mas sim, um preconceito que se refere a certo tipo de ‘personalidade’, julgada como improdutiva e disruptiva para a sociedade como um todo”.
No momento em que o Brasil debate de maneira séria e se propõe a fundamentar suas relações democráticas com base na prevalência dos direitos humanos, está ao mesmo tempo reconhecendo a existência de limites e condicionamentos à noção de soberania estatal, isto é, o Estado brasileiro fica submetido a governantes preconceituosos que se utilizam da vulnerabilidade de grupos sociais para conquistar eleitores.
A democratização do Estado brasileiro implica em transformações nos planos internos e internacionais neste momento onde se intensificam lutas pelos Direitos Humanos em uma perspectiva global. Democracia e direitos humanos se fazem premente na experiência brasileira, tendo em vista que o projeto democrático deve estar absolutamente condicionado à garantia dos direitos humanos.
Segundo Piovesan, a Constituição de 1988, em seu art. 5º atribuiu aos direitos humanos internacionais a hierarquia de norma constitucional, incluindo-os no elenco dos direitos constitucionalmente garantidos, que apresentam aplicabilidade imediata. Este texto demonstrou que dignidade da pessoa humana, bem como direitos e garantias fundamentais, vêm constituir princípios constitucionais que incorporam justiça, valores éticos a todo sistema jurídico brasileiro.
É fundamental o debate e a busca pela proteção de grupos vulneráveis no Brasil com a interação de uma política nacional democrática para que haja um processo de fortalecimento de proteção do ser humano. Segundo observa Warat “democracia é permitir a heterogeneidade em todos os seus aspectos. A heterogeneidade que permite o reconhecimento do outro e a fuga do dogmatismo como conhecimento”. Neste sentido, o Brasil deve assumir a obrigação de manter o seu Estado Democrático de Direito e de proteger, mesmo em situações de emergência direitos básicos e, sobretudo, construir uma sociedade livre, justa e solidária que garanta seu desenvolvimento, erradicar a pobreza e a marginalização, reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos sem preconceito de origem, sexo, cor, idade e quaisquer formas de discriminação.
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[1] Mestre em Direito pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI); Membro do grupo de pesquisa Novos Direitos na Sociedade Globalizada sustentada pela linha de pesquisa: Direito e Multiculturalismo. Aluna projeto PROCAD URI/UNISINOS.
Referências:
PIOVESAN, Flavia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 7. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.
SANTOS, Boaventura de Souza. Por uma concepção multicultural de Direitos Humanos. Revista Crítica de Ciências Sociais nº48. 1997.p.12.
SOUZA, Jessé. A construção social da subcidadania: para uma sociologia política da modernidade. Belo Horizonte: Ed. UFMG; Rio de Janeiro: IUPERJ, 2003, p. 159.
WARAT, Luis Alberto. Por quem cantam as sereias. Trad. de Julieta Rodrigues Sabóia Cordeiro. Porto Alegre: Síntese, 2000, 201 p .
* Fonte das imagens: http://petcomufam.com.br/2012/08/a-solucao-para-um-pais-homofobico.html