Até mesmo na academia – o que impressiona bastante – as pessoas continuam a confundir orientação sexual e identidade de gênero, colocando coisas totalmente distintas em um lugar comum de discussão. Para quem não sabe, orientação sexual diz respeito à atração afetivo sexual que sentimos por outra/outras pessoas, já as diferentes identidades de gênero, e aqui falando de forma bastante objetiva, se referem a formas de identificar e ser identificado. Pode parecer simples em termos conceituais, mas a confusão é recorrente. Parece que quando falamos de transexuais ou travestis a primeira impressão que surge na mente de quem nos houve é relacionada a sexualidade, quando na verdade longe estamos de discutir o assunto. Falar em visibilidade trans*[1] significa chamar a atenção para questões IDENTITÁRIAS, referentes ao exercício e garantia de direitos por pessoas silenciadas pelo “CIStema[2]“, que na forma como se aticula, as impossibilita (ou tenta impossibilitar) de existir em sua essência, como verdadeiramente são e sentem. Gênero nada tem a ver com sexualidade, é uma questão política e ontológica, cuja divisão tradicional é pautada pela binariedade homem/mulher, historicamente fundada na posse de determinado órgão genital (pênis para “ser” homem e vagina para “ser” mulher). E assumidas pelo senso comum geral como definições “naturais”. Isso porque tratar o que é histórico como natural, revela-se como uma estratégia sofisticada de poder. O natural não pode ser questionado, é porque é, ou porque alguma força superior (talvez Deus?!) quis assim.
A naturalização do gênero vinculado unicamente ao órgão genital ou ainda da heterossexualidade em detrimento de outras expressões da sexualidade humana, as blinda frente a qualquer possibilidade de pensamento crítico. Por esta razão há um considerável interesse, por parte dos ditos conservadores (e também opressores), em naturalizar o que é histórico e construído por intermédio do discurso. Mas porque é tão difícil a percepção da questão identitária? Por que a maioria das pessoas ainda percebe o estereótipo da pessoa trans* como o gay que quer se vestir de mulher, “a machorra” ou “o traveco”? A mídia, na sua maioria, erra fortemente ao veicular notícias em que a palavra transexual é destacada. Você pode ler por aí “Transexual Thalita Zampirolli diz ter mantido um affair com Romário”[3], ou ” Ex-BBB transexual se casa na Itália[4]“, mas não encontrará uma reportagem sequer que fale de uma mulher cisgênero adjetivando-a como tal. Ninguém diz: a mulher fulana de tal casou na Itália, ou a mulher cicrana tem um affair com tal jogador.
Esse tipo de referência serve apenas para perpetuar a ideia ultrapassada de que mulheres trans* não são mulheres ou ainda que são menos mulheres do que aquelas que nasceram com uma vagina. Quando na verdade, o que nos define como tal nada tem a ver com o órgão sexual que se carrega, nada tem a ver com a roupa que se usa ou com uma cirurgia. As conclusões que nos chegam a partir daí demonstram que há muito que se trabalhar a fim de que as demandas transfeministas possam ser vistas e tratadas como demandas de direitos humanos e que o foco desta discussão não está entre as pernas, mas entre as orelhas.