0 Comentário em 6 - agosto - 2013

Qual a forma mais adequada para a ressocialização de agentes condenados pela prática de crimes sexuais no Brasil? Mantendo o enfoque nos aspectos referentes ao Direito Penal Brasileiro e suas atualizações, tal questionamento se mostra altamente relevante ao nosso contexto atual, tanto sob o olhar ético quanto jurídico. Na atual tipificação do artigo 213 do Código Penal Brasileiro, o criminoso que pratica um delito sexual pode sofrer uma pena que varia entre 6 (seis) e 10 (dez) anos de reclusão.

O crime de estupro gera enorme comoção social, até mesmo entre os próprios detentos do sistema carcerário, que muitas vezes realizam a “justiça” por suas próprias mãos. Fonte da imagem: http://www.alagoas24horas.com.br/legba/admin/temp/thumbs/%7Bd468x350%7D/%7Bh0%7D/a/f/%7Bafffb367-8cef-438a-adc3-bfcf8b2bf946%7D_rafinha-bastos-piada-sobre-estupro.jpg

O crime de estupro gera enorme comoção social, até mesmo entre os próprios detentos do sistema carcerário, que muitas vezes realizam a “justiça” por suas próprias mãos. Fonte da imagem: http://www.alagoas24horas.com.br/legba/admin/temp/thumbs/%7Bd468x350%7D/%7Bh0%7D/a/f/%7Bafffb367-8cef-438a-adc3-bfcf8b2bf946%7D_rafinha-bastos-piada-sobre-estupro.jpg

O crime de estupro é delito que gera enorme comoção social, até mesmo entre os próprios detentos do sistema carcerário, que muitas vezes realizam a “justiça” por suas próprias mãos. O estuprador carrega um estigma consideravelmente superior ao de outros tipos de crime. Homicídios, roubos e delitos contra o patrimônio podem ser um fator de hierarquia ou status dentro do sistema prisional. Os detentos são mais ou menos respeitados dentro deste círculo e de acordo com aquilo que “têm assinado” lá fora. Já para o estuprador, não restam maiores glórias: ele não tem vez, voz ou lugar dentro de um sistema que funciona de acordo com regras próprias que, nem sempre, parecem ser muito justas; é um excluído social, tanto dentro como fora da prisão. Alguém que, na visão de seus pares, não possui sequer o direito de viver em sociedade.

O tema dos crimes sexuais, especificamente o estupro, envolve também questões políticas, além de religiosas e éticas. E justamente em virtude da pluralidade de argumentos em favor de cada um destes vieses, o tema se torna ainda mais complexo. Do ponto de vista jurídico, o qual aqui nos interessa, o principal questionamento se resume à possibilidade de alcançarmos uma efetiva possibilidade de ressocialização do infrator nestes crimes.

Conforme Galeno Alvarenga[1], psiquiatra e neurocientista, “os estudos acerca da personalidade do estuprador têm mostrado aspectos de interesse [relevante] para o entendimento de sua conduta sob o ângulo da psiquiatria”. Segundo o especialista, a maioria, senão a totalidade dos estupradores são, ou podem ser, diagnosticados como portadores de algum transtorno de personalidade antissocial. Este profissional refere em sua pesquisa que a bioquímica cerebral de indivíduos analisados demonstra, dentre outros, um déficit no neurotransmissor serotonina. A diminuição dessa substância no cérebro tem sido associada a atos impulsivos, impensados, agressivos e suicidas. Este médico está convencido de que o padrão criminoso incorporado na infância desses indivíduos não será extinto com punições carcerárias, pois a reclusão não puniria o padrão aprendido, mas somente o indivíduo que praticou o crime.

A discussão sobre alternativas penais à prática do crime de estupro é extremamente pertinente, considerando o perfil do agente deste tipo de delito e o atual momento político do país, em que se discute no Congresso Nacional a perspectiva de um novo Código Penal. Fonte da imagem: http://www.liberdadefmpocoes.com.br/wp-content/uploads/2013/07/preso.jpg

A pertinência da discussão sobre alternativas penais à prática do crime de estupro se dá a partir do perfil do agente deste tipo de delito e do atual momento político do país, em que se discute no Congresso Nacional a perspectiva de um novo Código Penal. Fonte da imagem: http://www.liberdadefmpocoes.com.br/wp-content/uploads/2013/07/preso.jpg

Nesse contexto, a partir do aporte trazido por pesquisadores como Alvarenga, questiona-se se os crimes sexuais deveriam ser objeto de políticas criminais diferenciadas, de modo que, para além da pena de reclusão, pudessem ser aplicadas ou viabilizadas medidas voltadas à saúde mental do réu como meio eficaz na busca de melhores resultados. A discussão é extremamente pertinente, sobretudo no momento em que se discute no Congresso Nacional a perspectiva de um novo Código Penal. Deixando de lado o preconceito e a revolta, típicos em relação a este tipo de crime e a quem o pratica, é fundamental que comecemos a discutir o assunto sob novos ângulos, a fim de que se possa caminhar a soluções que sejam, mais do que justas, mas especialmente mais humanitárias.

(por Ana Patrícia Wisniewski, mestranda do PPG em Direito da UNISINOS, bolsista PROSUP/CAPES e integrante do Núcleo de Direitos Humanos e Jéssica Barros, aluna da graduação em Direito da UNISINOS, bolsista PRATIC e integrante do Núcleo de Direitos Humanos)


 

[1] Galeno Alvarenga é Doutor em Filosofia, Livre Docente em Psicologia, Professor Adjunto de Psiquiatria e Titular de Psicologia da UFMG e Pesquisador.

Fontes da pesquisa e maiores informações em:

REGHELIN, Elisangela Melo. Crimes Sexuais Violentos.Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: Promulgada em 5 de Outubro de 1988. 35. ed. São Paulo: Atlas 2012.

LUISI, Luis. Os princípios constitucionais penais. 2. Ed. Porto Alegre: Sergio Fabris, 2003. P. 37.  

MARTINELLI, João Paulo Orsino. Código Penal Interpretado. São Paulo: Manole, 2011.

CAMPOS, Francisco. Exposição de motivos do Código Penal. Disponível em: <http://www.diariodasleis.com.br/busca/exibelink.php?numlink=1-96-15-1940-12-07-2848-CP>. Acesso em: 10 jun. 2012

SABINO, Thaís. Definir inimputabilidade é desafio para o Direito Penal. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2010-jan-31/definir-inimputabilidade-reus-ainda-desafio-direito-penal>. Acesso em: 10 jun. 2012

ALVIM, Rui Carlos Machado Apud. Uma pequena história das medidas de segurança. São Paulo: Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, 1987, p. 56

FERRARI, Eduardo Reale. Medidas de segurança e direito penal no estado democrático de direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

BAUMAN, Zygmunt. Em busca da política. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 200, p. 17- 18

ALVIM, Rui Carlos Machado. Uma pequena história das medidas de segurança. São Paulo: Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, 1987.

Gauer, Gabriel Chittó, FERLA GUILHERMANO, Thaís. Fatores biológicos associados à conduta agressiva. Curitiba: Juruá, 2001.

Lei nº 12.258, de 15 de junho de 2010. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/823422/lei-12258-10>. Acesso em: 10 jun. 2012.

DE SOUZA, Paulo Vinícius Sporleder. Bases genéticas do Transtorno de Personalidade Anti-Social sob um enfoque criminológico. In: GAUER, Gabriel Chittó (org). Agressividade: uma leitura biopssicossocial. Curitiba: Juruá, 2001, p.118.

categorias: Destaque, Reflexão

Deixe uma resposta