0 Comentário em 29 - abril - 2013

As últimas polêmicas envolvendo os povos indígenas no Brasil, especialmente através da comissão especial formada no Congresso Nacional para avaliação da PEC 215 (leia mais sobre isso aqui) e da carta aberta dos indigenistas da FUNAI à sociedade brasileira, reivindicando um efetivo plano de indigenismo brasileiro, vêm suscitando reflexões sobre o papel e a importância dos povos indígenas na configuração política, social e cultural do Brasil.

Fonte da imagem: http://direitoamoradia.org/?p=17402&lang=pt

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Nesse sentido, pensar no desenvolvimento violento e opressor, e que as elites ruralistas têm conseguido o apoio do Estado nas demandas que envolvem demarcações de terras – leia-se o episódio do anúncio de morte coletiva pela comunidade Guarani-Kaiowá e as recentes discussões sobre a PEC 215 –, assim como que os direitos indígenas expressos na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) não estão regulamentados por legislação ordinária brasileira, leva a uma questão muito importante sobre o projeto de sociedade e de Estado que temos, ancorado pelo modelo de Estado de Nação que perpassa as bases institucionais brasileiras.

O modelo de Estado-Nação concebido na modernidade, como foi implementado na América Latina, repercutiu, nas palavras do sociólogo peruano Anibal Quijano (2005), numa “tragédia de equívocos”. Por consistir numa estrutura de poder e mesmo um produto do poder, não poderia, na América Latina, ter sucesso se consideradas as violências trazidas ao continente pelo colonialismo, desde a divisão e o controle do trabalho pela raça e pelo gênero até mesmo às relações que foram estabelecidas no âmbito da autoridade, da identidade, das intersubjetividades e do conhecimento.

Isso porque esse espaço de poder oportunizado pelo Estado-Nação se configura a partir de uma participação democrática no efetivo controle da esfera pública, o que implica na necessidade de um poder político estável e centralizado. A ideia moderna/europeia de organização política dentro dos parâmetros do Estado-Nação é confrontada com a experiência da pluralidade dos povos da América Latina através da impossibilidade de se alcançar a homogeneização nacional da população latino-americana, segundo o viés eurocêntrico, sem antes passar por um processo radical e global de democratização, o qual passaria pela descolonização das relações sociais, políticas e culturais entre todos os grupos.

Fonte da imagem: http://www.cartacapital.com.br/sociedade/indigenas-sofrem-com-altas-taxas-de-suicidio/

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Com isso, a colonialidade do poder que se verifica nas demandas indígenas, na necessidade de se lutar pela efetivação de um projeto indigenista brasileiro, a ausência de regulamentação dos direitos indígenas e os constantes confrontos das comunidades com os interesses de poder dos grandes latifundiários, indicam que os interesses políticos no Brasil colidem com os interesses da maioria da plural população brasileira, especialmente no que tange às comunidades tradicionais formadas por indígenas e, vale lembrar, as remanescentes de quilombos. O problema da necessária ressignificação do Estado-Nação no contexto latino-americano, especialmente no Brasil, coexiste ao problema da globalização e das disputas de poder desiguais, em que o capital abra caminhos para quem oprime e mantenha na marginalização quem é oprimido. Por tudo isso, acredita-se ser necessário que a política se abra por si e para a concretização de direitos no contexto do pluralismo étnico e cultural que forma as bases sociais do Brasil. A aprovação de um Estatuto dos Povos Indígenas, que regulamente os direitos dispostos na Convenção 169 da OIT e as garantias constitucionais de proteção aos povos indígenas, seria um indício de libertação da colonialidade e da opressão decorrentes do desenvolvimentismo, seria um caminho de abertura e de inclusão para uma nova configuração do atual fechado e excludente projeto de Estado-Nação brasileiro.

(por Karina Macedo Fernandes, mestranda do PPG em Direito da UNISINOS, bolsista PROSUP/CAPES e membro do NDH)

Mais informações em: 

Carta aberta da FUNAI à sociedade brasileira

Convenção 169 da OIT sobre povos indígenas e tribais

IHU Unisnos: Atual projeto de nação não tem lugar para povos indígenas, diz indígena e doutor em antropologia

categorias: Destaque, Reflexão

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