Em 17 de abril deste ano, o Massacre de Eldorado dos Carajás completou 17 anos. Em um dos crimes mais chocantes da história recente brasileira, 21 pessoas foram assassinadas e 66 ficaram feridas na operação da Polícia Militar para bloquear os 1.500 trabalhadores rurais participantes de uma marcha organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no município de Eldorado dos Carajás, no Pará. Dezenove foram executados na hora e dois morreram dias depois. O dia do Massacre de Eldorado de Carajás se tornou oficialmente o Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária.

Trabalhadores sem-terra assinados pela Polícia Militar. Fonte da imagem: http://fafidam-uece.blogspot.com.br/2011/04/familias-sobreviventes-do-massacre-de.html
O conflito marca também a constância da impunidade, que não deixou de envolver os conflitos fundiários e as graves violações de direitos humanos no campo brasileiro. O coronel Mario Colares Pantoja e o major José Maria Pereira de Oliveira foram presos apenas 16 anos após o crime, em maio de 2012. Os 155 policiais militares executores diretos do massacre foram absolvidos. O então governador do Estado do Pará, Almir Gabriel, e o secretário de Segurança Pública, Paulo Sette Câmara, não foram indiciados.
Mobilizações foram realizadas pelo MST e por diversas frentes de luta e organizações em defesa da reforma agrária e dos direitos humanos em todo o Brasil, e continuam sendo articuladas durante o mês de abril. A demora nos processos de desapropriação, o descaso com as famílias acampadas e assentadas, a impunidade que predomina nos casos de conflitos no campo, a falta de investimentos na agricultura familiar e o estímulo ao agronegócio são elementos que, em uma realidade social e política complexa, impulsionam mais ainda a organização popular e as recentes manifestações. Estes fatores podem, igualmente, nortear a análise dos dados recentes lançados no Relatório Conflitos no Campo no Brasil 2012.

Charge de Latuff. Fonte da imagem: https://calendario.sarava.org/pt-br/evento/mem%C3%B3ria-massacre-de-eldorado-dos-caraj%C3%A1s
A publicação foi apresentada durante uma solenidade, na última segunda-feira, dia 22 de abril. No ano passado, os conflitos no campo somaram 1.364, desses, 1.067 são conflitos por terra. Foram registrados 36 assassinatos, um aumento de 24% em relação ao ano de 2011. Os conflitos pela água subiram de 68, em 2011, para 79 nesse último ano. Além disso, houve um aumento expressivo no número de tentativas de assassinato. Passou de 38, em 2011, para 77 em 2012. Além disso, as famílias vítimas de pistolagem subiram de 15.456, em 2011, para 19.968, em 2012. Um crescimento de aproximadamente 30%, o maior índice desde 2004.
Em relação aos conflitos envolvendo direitos territoriais indígenas, um dado alarmante aponta que, em Mato Grosso do Sul, das 21 pessoas que sofreram ameaças de morte ao longo do ano de 2012, 18 são índios das etnias Xavante e Myky. Além deles, a lista de vítimas inclui o bispo emérito da Prelazia de São Félix do Araguaia, Dom Pedro Casadáglia, e o ex-prefeito de Alto Boa Vista (município a 1.064 km de Cuiabá), Wanderley Perin.
O crescimento dessas ocorrências – afora os muitos casos impossíveis de serem acessados ou contabilizados – apontam que as estruturas democráticas de nossa sociedade precisam ser fortalecidas, especialmente por meio da organização e mobilização dos movimentos sociais, comunidades tradicionais, povos indígenas e ribeirinhos em luta constante por outro modelo de desenvolvimento econômico, social e político. No entanto, ainda é preciso avançar, e muito, na dimensão institucional e jurídica no âmbito da efetivação do direito à terra e ao território, especialmente no que tange à segurança e ao combate à impunidade nos conflitos fundiários.
(por Natalia Martinuzzi Castilho, mestranda do PPG em Direito da UNISINOS, bolsista PROSUP/CAPES e membro do NDH)
Acesse aqui a íntegra do Relatório Conflitos no Campo 2012: http://migre.me/egetq
Mais informações em:
Plataforma Brasileira de Direitos HumanosEconômicos, Sociais, Culturais e Ambientais: Jornada de Lutas: De Carajás a Felisburgo, violência contra trabalhadores do campo persiste
Portal do MST: MST mobiliza em 19 estados e tranca mais de 60 rodovias
IHU Notícias: Relatório da CPT mostra que assassinatos no campo crescem 24% em um ano
IHU Notícias: Índios são maioria em lista de ameaçados de morte em MT