08 de março é o dia internacional da mulher, data que, muito mais do que comemorativa das lutas do movimento feminista, tem o propósito de incentivar a reflexão sobre o papel da mulher na sociedade, fomentando a luta pelo fim da opressão e das desigualdades consubstanciadas pelo gênero; é o momento de se discutir e procurar soluções sobretudo para a violência contra a mulher, a qual se manifesta de forma simbólica e esclarecida – principalmente através da violência física.
A origem da criação do Dia da Mulher remonta ao ano de 1910, quando um grupo de mulheres decidiu este propósito na Conferência das Mulheres Socialistas, na Dinamarca. O dia não foi determinado nesta ocasião, apenas o mês, março. Neste mês, em cada país, as mulheres socialistas designavam o Dia da Mulher à sua livre escolha.
08 de março e seus mitos
O dia 08 de março foi escolhido por ser o dia do calendário gregoriano referente a 23 de fevereiro de 1917 pelo calendário russo, data em que mulheres tecelãs da Rússia empreenderam uma greve que mudou completamente os rumos da política do país, iniciando a queda do regime de opressão czarista e culminando no estopim da Revolução Russa que ocorreu no mês de outubro daquele ano. Posteriormente, em 1921, a Conferência das Mulheres Comunistas, realizada em Moscou, adota oficialmente o dia 8 de Março como data unificada do Dia Internacional das Operárias.
É Vito Gianotti (para ler o artigo completo clique aqui), do NPC (clique aqui), quem explica a origem, relatando que a história da greve das mulheres tecelãs ficou esquecida durante muito tempo, em razão de ter circulado entre o movimento feminista e o movimento dos trabalhadores, entre as décadas de 50 e 60, uma versão de que em 1857, em Nova Iorque, durante uma greve, 129 operárias têxteis haviam morrido queimadas após o patrão ter ateado fogo à fábrica.
Desde a década de 70, porém, esta história passou a ser questionada por diversos estudiosos do tema. Teria mesmo ocorrido esta greve com mulheres queimadas? Não havia notícias sobre ela em nenhum jornal ou outro documento da época. Sequer relatos orais. Vários pesquisadores foram investigar a origem da data.
Nesse sentido, o mito se originou provavelmente no jornal do Partido Comunista Francês, na véspera de 08 de março de 1955; todavia, consolidou-se numa publicação da Federação Internacional Democrática das Mulheres, de 1966, na então Alemanha Oriental.
A desmitificação da origem do dia 08 de março foi contruída com muito trabalho e pesquisa. A canadense Renée Côté, no livro Dia da Mulher: Dia Internacional da Mulher: em busca da memória perdida, pesquisou, durante doze anos, em todos os arquivos da Europa, EUA e Canadá e não encontrou nenhuma traça da greve de Nova Iorque de 1857, nem nos jornais da grande imprensa da época, nem mesmo em qualquer outra fonte de memórias das lutas operárias. Isso fez com que a pesquisadora afirmasse que essa greve nunca existiu: é um mito criado por causa da confusão com a greve de 1910; com o incêndio de 1911, nos EUA; e com a greve das costureiras de São Petersburgo, na Rússia, em 1917.
O mito das 129 mulheres queimadas e da greve que nunca existiram nasceu, ao que tudo indica, de uma preocupação com a ampliação do alcance do Dia da Mulher; de deixar de contemplar o “Dia das mulheres comunistas” e chegar a um dia geral da luta da mulher, independemente de orientação política ou religiosa e que enaltecesse a busca da identidade e da libertação da mulher.
Já Adriana Jacob Carneiro, do Observatório da Imprensa, defende que a greve de Nova Iorque aconteceu sim, porém somente em 1908 (51 anos depois), sem incêndio (para ler o artigo completo, clique aqui). O incêndio teria ocorrido em 1911, no dia 25 de março (e não no dia 8), devido à combinação entre instalações elétricas precárias e produtos têxteis inflamáveis – muito embora a porta de saída da empresa estivesse fechada para evitar que as operárias roubassem materiais ou fizessem pausas. Morreram 146 pessoas, 125 mulheres e 21 homens, na maioria judeus. Adriana diz que o jornal Folha de São Paulo chegou até mesmo a fazer uma matéria especial, em 2007, sobre o incêndio que não ocorreu. A jornalista também refere a greve das tecelãs russas, em 1917, como a primeira data da referência direta ao dia da mulher.
Não obstante à imprecisão dos fatos históricos e e à associação da data ao universo do consumo, o dia internacional da mulher é um momento importante para se refletir sobre as lutas pelos direitos e pela dignidade das mulheres, bem como pela igualdade de gênero.
A poesia de Sóror Juana Inés de la Cruz

Retrato de Sóror Juana Inés de la Cruz. Miguel Cabrea, 1750. Fonte: http://www.sitescorreio.com.br/blogs/wfarias/wp-content/uploads/2012/09/soror-juana-ines-de-la-cruz1.jpg
Singular – e pouco conhecida – mulher latino-americana, Sóror Juana Inés de la Cruz foi uma escritora barroca, poetisa e dramaturga da segunda metade do século XVII. Nasceuem um povoado do vale do México, San Miguel Nepantla, em 12 de Novembro de 1651, e faleceu na Cidade do México em 17 de Abril de 1695. Abaixo, transcrevo seu poema Hombres Necios (“Homens Estúpidos”), onde ela defende o direito da mulher a ser respeitada como ser humano e critica o sexismo da sociedade do seu tempo, especialmente o cinismo da exploração da prostituição:
“Arguye de inconsecuentes el gusto
y la censura de los hombres que en
las mujeres acusan lo que causan
Hombres necios que acusáis
a la mujer sin razón,
sin ver que sois la ocasión
de lo mismo que culpáis:
si con ansia sin igual
solicitáis su desdén,
¿por qué queréis que obren bien
si las incitáis al mal?
Combatís su resistencia,
y luego con gravedad
decís que fue liviandad
lo que hizo la diligencia.
Queréis con presunción necia
hallar a la que buscáis,
para pretendida, Tais,
y en la posesión, Lucrecia.
¿Qué humor puede ser más raro
que el que falta de consejo,
él mismo empaña el espejo
y siente que no esté claro?
Con el favor y el desdén
tenéis condición igual,
quejándoos, si os tratan mal,
burlándoos, si os quieren bien.
Opinión ninguna gana,
pues la que más se recata,
si no os admite, es ingrata
y si os admite, es liviana.
Siempre tan necios andáis
que con desigual nivel
a una culpáis por cruel
y a otra por fácil culpáis.
¿Pues cómo ha de estar templada
la que vuestro amor pretende,
si la que es ingrata ofende
y la que es fácil enfada?
Mas entre el enfado y pena
que vuestro gusto refiere,
bien haya la que no os quiere
y quejaos enhorabuena.
Dan vuestras amantes penas
a sus libertades alas,
y después de hacerlas malas
las queréis hallar muy buenas.
¿Cuál mayor culpa ha tenido
en una pasión errada,
la que cae de rogada
o el que ruega de caído?
¿O cuál es más de culpar,
aunque cualquiera mal haga:
la que peca por la paga
o el que paga por pecar?
Pues ¿para qué os espantáis
de la culpa que tenéis?
Queredlas cual las hacéis
o hacedlas cual las buscáis.
Dejad de solicitar
y después con más razón
acusaréis la afición
de la que os fuere a rogar.
Bien con muchas armas fundo
que lidia vuestra arrogancia,
pues en promesa e instancia
juntáis diablo, carne y mundo.”
Dia Internacional da Mulher: unidade e independência ainda são desafios – Jornal Sul21
”O feminismo transformou o mundo”. Entrevista especial com Rose Marie Muraro no IHU Unisinos
Evento: Dia internacional da mulher – Protagonismos e resistência: mulheres e suas lutas – Unisinos
(por Karina Fernandes, mestranda PPGD/UNISINOS, bolsista PROSUP/CAPES e membro do NDH e Fernanda Frizzo Bragato, professora doutora do PPGD e da Graduação em Direito da UNISINOS e coordenadora do NDH)