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O Instituto Humanitas Unisinos – IHU realiza seu IV Colóquio Internacional, de 13 a 14 de setembro, à luz de três aspectos que permeiam as sociedades atuais: Políticas Públicas, Financeirização e Crise Sistêmica.
Crise Sistêmica
O mundo contemporâneo atravessa uma grave crise econômica desde 2008, que vem aumentando as desigualdades; passa por uma crise ambiental, que apela por mudanças imediatas; trava diversas crises sociais, que emergem das alterações que colocam em causa as estruturas e por consequência geram incerteza generalizada. Essas diversas crises estão relacionadas entre si e são definidas como crises sistêmicas, segundo a compreensão de Giuseppe Cocco e Andrea Fumagalli.
Financeirização
Essas crises sistêmicas estão relacionadas à questão da financeirização, que é observada como o agente impulsionador da terceira geração do capitalismo, ou seja, o capitalismo cognitivo. Este é visto como um período de transição que traz a complexificação de inúmeros problemas, colocando o planeta e a sociedade em um momento de esgotamento, segundo Yann Moulier Boutang.
Professor da Universidade de Tecnologia de Compiegne – UTC, Boutang concedeu uma entrevista à IHU On-Line, em que explica a relação da financeirização com o esgotamento planetário. Para ele, a financeirização “não é a pulsão de morte [do capitalismo], ela é uma resposta por falta de alternativa a essa finitude planetária e ao risco político que afeta a sobrevivência da relação capitalista, não mais do lado da exploração dos homens, mas do lado da exploração do planeta, que conduz à morte global. A finança em si mesma não é a pulsão de morte do capitalismo: ela representa sua forma de sobrevivência, de resiliência, portanto é antes sua pulsão de vida, mas essa pulsão de vida está a serviço de uma relação que enfrenta agora, ela mesma, a questão da morte global da espécie na era do antropoceno”.

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Quanto à financeirização, Gaël Giraud faz sua relação direta com o endividamento, tendo em vista a adoção do modelo neoliberal, prevenindo que este modelo econômico está atrelado a “uma economia essencialmente fundada sobre a dívida, e tal já vem desde 5000 anos atrás. Quando se tem muitas dívidas, acaba-se por se tornar escravo (no sentido literal e figurado) do credor. Se queremos sair do servilismo, temos de sair do neoliberalismo”.
Políticas Públicas

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Essas situações de crise sistêmica, resultado de um intenso processo de financeirização de grande parte das dimensões da vida, também se aplicam ao Brasil, que atravessa uma grave crise econômica com reflexos sociais, gerando assim crise social com a questão do desemprego, por exemplo, e também passa por severas crises ambientais, como o desastre ocorrido na cidade de Mariana, após o rompimento da Barragem de rejeitos da Samarco. Isso evidencia que as políticas públicas vêm sendo deixadas de lado no país, com a finalidade de atender aos interesses de grandes empresas, políticos, bancos etc. Daí a necessidade de uma reflexão acerca dessas políticas para que elas não se tornem um dispositivo da acumulação financeira, conforme propõe a professora Lena Lavinas.
Sobre essa questão, a professora do Instituto de Economia da UFRJ, em artigo reproduzido no sítio do IHU, alerta que as políticas sociais, que fazem parte do guarda-chuva das Políticas Públicas, “têm por finalidade reduzir vulnerabilidades, prevenir a pobreza, equalizar oportunidades e, sobretudo, desmercantilizar acesso, garantindo direitos. No Brasil a perversidade é tamanha que se usa a política social como colateral para dar acesso ao sistema financeiro, de forma a potencializar um consumo represado por salários relativamente baixos e uma estrutura de preços relativamente caros, com produtos medíocres, produtividade em queda e juros em alta”.
IV Colóquio Internacional IHU
Pensando na importância da reflexão sobre estes três aspectos que tangem à vida moderna, o Instituto Humanitas Unisinos – IHU promove o IV Colóquio Internacional IHU. Políticas Públicas, Financeirização e Crise Sistêmica, nos dias 13 e 14 de setembro de 2016, na Unisinos São Leopoldo.
O evento terá a presença de pesquisadores nacionais e internacionais, e já confirmaram presença o Prof. Dr. Gaël Giraud do Centre National de la Recherche Scientifique – CNRS; Prof. Dr. Yann Moulier Boutang da Universidade de Tecnologia de Compiegne – UTC; Bernardo Gutiérrez da Global Revolution Research Network e da Universitat Oberta de Catalunya (UOC); Prof. Dr. Giuseppe Cocco, da UFRJ; Profa. Dra. Francini Lube Guizardi da Fiocruz/Brasília; e Prof. Dr. João Sicsú da UFRJ.
Conheça os conferencistas

Foto: Jornal GGN
Prof. Dr. Gaël Giraud, conhecido como o “jesuíta que enfrenta os bancos”, é economista, diretor de pesquisa do Centre National de la Recherche Scientifique – CNRS, membro do Centro de Economia da Sorbonne e da Escola de Economia de Paris e professor associado na ESCP-Europe. Como Jesuíta faz parte do conselho científico do Laboratório sobre Regulação Financeira e do Observatório Europeu Finance Watch. Além disso, leciona no Centre Sèvre de Paris e é membro do conselho científico da Fundação Nicolas Hulot para a Natureza e o Homem.
O trabalho de Gaël Giraud pode ser visto em seu site www.gaelgiraud.net. É autor de vários livros, entre eles, Illusion financière (Paris: Les Éditions de l’Atelier, 2014), Le facteur 12. Pourquoi il faut plafonner les revenus (Paris: Carnets Nord-Montparnasse éditions, 2012) e Vingt propositions pour réformer le capitalisme (Paris: Ed. Flammarion, 2009).
O economista já alertou, em entrevista à IHU On-Line, para a importância de uma mudança nas finanças planetárias para evitarmos uma catástrofe. “A racionalidade que a economia neoclássica promove é uma racionalidade mortífera, de uma humanidade que não crê mais em seu futuro e cujas elites tentam se apropriar do máximo de riquezas possíveis para salvar sua pele quando o Titanic afundar”, adverte.

Foto: networkcultures.org
Prof. Dr. Yann Moulier Boutang é economista, professor de ciências econômicas na Universidade de Tecnologia de Compiègne e professor no Centro Fernand-Braudel da Universidade de Binghamton-New York, EUA. Participou do Movimento 22 março, em 1968, na França, que tinha como objetivo a libertação de jovens presos, e de muitas outras ações naquele ano. Em 1973, conheceu Antonio Negri, de quem é parceiro intelectual. Em 1974, criou a revista Camaradas, que trata dos temas da “Autonomia Operária”, conceito adotado então na Itália por militantes procedentes do operariado. Camaradas é um dos primeiros grupos do movimento autônomo na França. Após a autodissolução da revista, Boutang participou, de 1979 a 1981, do Centro Internacional para Novos Espaços de Liberdade – CINEL, uma iniciativa de Félix Guattari. É redator chefe da revista política, artística e filosófica Multitudes.
Estão entre suas obras: De l’esclavage au salariat. Économie historique du salariat bridé (Paris: PUF, 1998), Le droit dans la mondialisation: une perspective critique (Paris: PUF, 2002), Le capitalisme cognitif. La nouvelle grande transformation (Editions Amsterdam, 2007) e L’Abeille et l’Économiste (Paris: Carnets Nord, 2010).

Foto: www.wawancara.es
Bernardo Gutiérrez é jornalista, escritor e pesquisador hispano-brasileiro residente em São Paulo. Escreve sobre política, sociedade e cultura brasileira e latino-americana, movimentos sociais, processos tecnopolíticos e redes. No ano passado apresentou a pesquisa latino-americana Nuevas Dinámicas de Comunicación, Organización y Agregación Social. Reconfiguracines tecnopolíticas, para OXFAM (Comitê de Oxford para Alívio da Fome) e dirigiu o projeto Wikipraça, para a Prefeitura de São Paulo. Acompanhou o desenvolvimento dos governos progressistas latino-americanos, do zapatismo à chegada de Evo Morales ao poder, passando pelo lulismo.
Nos últimos anos, participa, escreve e pesquisa sobre tecnopolítica e sobre o ciclo de protestos aberto pela Primavera Árabe. Acompanhou de perto e por dentro as jornadas de junho e sua evolução, sendo um dos editores do livro JUNHO: potência das ruas e das redes. Ao mesmo tempo, nos últimos dois anos e meio, ficou envolvido no projeto equatoriano Buen Conocer/FLOK Society, uma tentativa de mudança de matriz produtiva do país, baseada no Buen Vivir e nas tecnologias livres.
O jornalista comentou, em recente entrevista à IHU On-Line, a conjuntura latino-americana e a adesão dos governos progressistas a políticas neoliberais, o que levou ao fracasso das políticas públicas. Para ele, “a maioria de ‘governos progressistas’ tem abraçado o capitalismo, como horizonte e ferramenta transformadora. A inclusão pelo consumo, na maioria dos casos, não chegou da mão da inclusão pelos direitos. O nacional-desenvolvimentismo, baseado em grandes infraestruturas e na exportação de commodities, foi o modelo”.

Foto: Ricardo Machado / IHU
Prof. Dr. Giuseppe Cocco é professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ e editor das revistas Global Brasil, Lugar Comum e Multitude. Graduado em Ciência Política pela Université de Paris VIII e pela Università degli Studi di Padova, é mestre em Ciência, Tecnologia e Sociedade pelo Conservatoire National des Arts et Métiers e em História Social pela Université de Paris I (Panthéon-Sorbonne), é doutor em História Social pela Université de Paris I (Panthéon-Sorbonne). Coordena a coleção A Política no Império (Civilização Brasileira).
O professor já contribui em diversas oportunidades com a IHU On-Line. Em uma das suas entrevistas falou do desafio para a superação do modelo financeirizado. “O que ‘falta’ hoje é a ‘medida comum’ que torne possível a manifestação da comunidade por meio da articulação das diferenças. O desafio não é a luta contra as finanças, mas a construção das instituições adequadas das finanças do comum, ou seja, que tenham como base a medida do comum”, propõe.

Foto: Ricardo Machado / IHU
Profa. Dra. Francini Lube Guizardi é graduada em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo, mestre e doutora em Saúde Coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. Atualmente é pesquisadora em saúde pública da Fundação Oswaldo Cruz, na Escola de Governo em Saúde, da Fiocruz Brasília.
Francini já esteve no IHU participando do Ciclo de Estudos sobre as Metrópoles, quando avaliou o funcionamento da democracia, analisando que “a política serve para chegar a algum lugar. A democracia, em seu modo hegemônico, tem esse caráter teleológico. Nem o projeto liberal nem o de esquerda compreendeu a democracia como um sistema aberto de constituição, o que gera o desafio é pensar essa experiência sem constituir um ponto de chegada”.
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Foto: jb.com.br
Prof. Dr. João Sicsú é doutor em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, onde leciona no Instituto de Economia.
João Sicsú, em artigo reproduzido na página do IHU, falou sobre a desigualdade em relação à distribuição de renda e a sua importância para a melhora da economia brasileira, dentro desse sistema de acumulação. “O dinheiro público que jorra para as mãos dos banqueiros e rentistas tem que ir para as mãos dos que mais precisam. O dinheiro que vai para as mãos dos miseráveis, dos pobres, dos trabalhadores e funcionários públicos de renda média, dinamiza a economia. Se transforma em consumo, gera empregos, salários e lucros e estimula o investimento produtivo”, pontua.
Serviço
IV Colóquio Internacional IHU. Políticas Públicas, Financeirização e Crise Sistêmica
Quando: 13 e 14 de setembro de 2016
Onde: Campus Unisinos São Leopoldo
Evento Gratuito
A programação completa do evento está disponível aqui.
Por Cristina Guerini
Saiba mais sobre os temas em pauta:
- Políticas Públicas em tempos de ajuste fiscal. Um debate. Revista IHU On-Line, Nº. 473.
- A financeirização da vida. Os processos de subjetivação e a reconfiguração da relação ‘economia e política’. Revista IHU On-Line, Nº. 468.
- “Os mercados financeiros são o coração pulsante do capitalismo cognitivo”. Revista IHU On-Line, N°. 302.
- O capitalismo cognitivo e a financeirização da economia. Crise e horizontes. Revista IHU On-Line, Nº. 301.
- O mundo do trabalho e a crise sistêmica do capitalismo globalizado. Revista IHU On-Line, Nº. 291.
- O trabalho no capitalismo contemporâneo. A nova grande transformação e a mutação do trabalho. Revista IHU On-Line, Nº. 216.
- Da dívida ecológica ao débito do sistema financeiro com os pobres. Entrevista especial com Gaël Giraud
- Os impactos da financeirização sobre o sujeito. Entrevista especial com Andrea Fumagalli
- Capitalismo cognitivo e trabalho imaterial. Entrevista com Maurizio Lazzarato
- Do Welfare State para o Workfare e a necessidade de novos sistemas financeiros autônomos. Entrevista especial com Andrea Fumagalli
- A esquerda na América Latina: dos militantes clássicos à mobilização baseada em pautas concretas. Entrevista especial com Bernardo Gutiérrez
- Política brasileira é varejo do dia a dia. Entrevista especial com João Sicsú
- Por uma política social pública. A luta contra uma assistência social considerada como mero sistema gerencial. Entrevista especial com Berenice Rojas
- Brasil reduz a intensidade da pobreza, mas não acaba com a miséria. Entrevista especial com Lena Lavinas
- Capitalismo cognitivo. A financeirização, em crise, é a sua forma econômica real. Entrevista especial com Gigi Roggero
- “Os mercados financeiros são o coração pulsante do capitalismo cognitivo”. Entrevista especial com Andrea Fumagalli
- Ainda dá tempo de arrumar a economia, é só querer
- A ecologia econômica como alternativa às desigualdades. Entrevista especial com Gaël Giraud
- Além da moral dos bancos. Entrevista com Gaël Giraud
- Gaël Giraud: o jesuíta que enfrenta os bancos
- Em nome da austeridade. Artigo de Lena Lavinas
- “Depois da crise política e econômica, virá a crise social”
- ”Se quisermos resolver as causas da crise ambiental, é errado operar sobre os efeitos.” Entrevista com Ettore Gotti Tedeschi
- ‘Nosso modelo econômico é o vilão da crise ambiental‘