Carlos Lessa, que estará na Unisinos no dia 23 de agosto, escreveu o artigo “Belo Monte e o diabo“, publicado no jornal Valor e reproduzido nas Notícias do Dia, 31-05-2010.
Peter Midkiff, leitor das Notícias do Dia, comenta e contesta a opinião do economista e ex-presidente do BNDES, em mensagem enviada à IHU On-Line.
Eis o comentário.
Caro Carlos Lessa, autor desta matéria, eu gostaria que o Sr. considerasse a informação que exponho abaixo. É um assunto pertinente que deve ser analisado, corrigido (e, se for o caso) ampliado para uma discussão maior. Pelo que eu percebo, a energia hidrelétrica não é uma energia ‘renovável’, sustentável, ou ‘limpa’.
As represas hidrelétricas tem vida útil de 50, 70, até 100+ anos, apenas. Com o tempo, as represas ficam sedimentadas – assoreados com detritos (areia, terra) carregados pelo processo de erosão natural nas cabeceiras nos períodos chuvosos. Depois de assoreado, a represa fica com apenas uma fina lâmina de água superficial, sem reserva hídrica para a geração de energia.
A imensa quantidade de sedimentos depositados ao longo do tempo impossibilita a sua remoção, e não teria onde depositar essa quantia de sedimentos. E é apenas no fim da vida útil que aparecem os principais problemas sócio-econômicos: não tem mais peixe, não gera mais energia, não gera mais impostos, não há mais navegação comercial, o que levaria á um colapso econômico-ambiental após varias décadas de aquecimento econômico.
Esses efeitos só apareceriam em 4,5,6 gerações, lá para frente, no futuro, quando os executores, os técnicos de licenciamento e os governantes vigentes não estarão mais vivos… E pior, as pessoas, as comunidades futuras que vão sofrer com estas e outras consequências secundárias, essa nova geração de pessoas cidadãos, ainda não nasceram hoje; ainda não estão entre nós para expor as suas opiniões, para pedir consideração e exigir seus direitos constitucionais á um ambiente minimamente equilibrado, passível ainda de sustentar a vida e gerar cultura e desenvolvimento sustentável econômico e social.
Eu nunca vi ou ouvi falar de um Plano de Recuperação Ambiental ou um Programa de Encerramento de Projeto (quando chega o fim da vida útil) incluído nos condicionantes de licenciamento de projetos hidrelétricos. Como outros projeto de impacto, deve ser formulado um plano de recuperação e diminuição desses impactos – ou mesmo contemplar alternativas tecnológicas, econômicas ou sociais para garantir o direito ambiental dos nossos descendentes, dos nossos herdeiros.
É uma cegueira não enxergar para frente, é uma falta de sensitividade; é uma irracionalidade não contemplar a qualidade de vida das nossas futuras gerações. São nossos ta-ta-ra-netos, ta-ta-ta-ra-netos, que vão sofrer as consequências de nossas ações hoje; são os nossos herdeiros, nossos queridos filhos dos filhos dos filhos que vão sofrer á médio e longo prazo as consequências dos nossos atuais atos. A falta de uma visão para o futuro, para além das nossas próprias vidas torna inconsequente a nossa forma de pensar, de planejar.
A constituição especificamente defende as futuras gerações. Os autores da Constituição foram pensadores seculares, e previam tambem um mundo equilibrado para nós e para nossos descendentes. O uso de tanta energia para ‘eletro-intensivos’ (mineração e exportação de matéria-prima, não manufaturada) é uma outra questão a ser melhor avaliada.
Um governo socialista deveria exigir de empresas/países que querem minerar aqui, que somente podem ‘exportar’ produtos manufaturados, e não bens primários. Exportar matéria-primária, não beneficiada, é, como dizem, ‘exportar empregos’ brasileiros. Um governo socialista, do PT, deveria no mínimo, exigir das empresas estrangeiras a implantação de fábricas para o beneficiamento dos bens primários em produtos manufaturados com mão de obra brasileira, gerando empregos aqui e não lá fora.
Desta forma também deixamos uma vasta reserva mineral para as nossas futuras gerações fazerem o mesmo com seus descendentes.
Agradeço a oportunidade, e eu gostaria de um retorno sobre estas questões: por favor me corrija se eu estiver errado nas minhas colocações.
Peter Midkiff – piter.veadeiros@yahoo.com.br