Tudo se encaminhava para ser mais um dia comum na vida do líder sindical Santo Dias da Silva. Era 30 de outubro de 1979, o Brasil ainda vivia sob a Ditadura Militar e, enquanto Dias reunia trabalhadores à fábrica Sylvania para participarem de uma greve, a polícia militar começou a se aproximar para interver na situação. Logo, deu-se início à confusão entre policiais e militantes. Em meio ao tumulto, o PM Herculano Leonel deu um tiro em Silva. Era para ser mais um dia de luta pelos trabalhadores. Mas não foi. Aquele foi o último dia da vida de Santo Dias da Silva.

Foto: www.pastoralfp.com
Operário de sonho e de criança
Operário da terra e oficina
Operário que um dia se cansa
De esperar as mudanças de cima
Operário, esperança que vela
Operário suado, sem fala
Operário algemado na cela
Operário calado à bala! […]
Santo, a luta vai continuar!
(Luiz Augusto Passos)
Santos Dias da Silva foi um dos mártires que morreram durante a Ditadura Militar, regime que predominou no Brasil de 1964 a 1985. Sempre defendendo os ideais dos metalúrgicos e trabalhadores, Silva, nascido em 1942, iniciou ainda jovem na luta por melhores condições de trabalho.
Militância
O operário iniciou sua vida de militante aos 20 anos quando se juntou ao movimento operário. Começou lutando por aumentos salariais e o direito ao 13º salário. Em 1965, durante a Ditadura Militar, Silva passou a integrar a Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo.
Ainda na década de 60, o militante começou a atuar em outras organizações que surgiram na capital. Católico praticante, Silva se tornou membro ativo das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), grupo ligados à Igreja Católica e, também, participou de vários movimentos de bairro que surgiram a partir das ações das CEBs.

Protesto pela morte de Santo Dias. Fonte: Pastoral Fé e Política – Arquidiocese de São Paulo
Movimento Sindical
Em outubro de 1979, a Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo, que já tinha Silva entre seus principais líderes, estava reivindicando um aumento salarial de 83%. Seus patrões recusaram o pedido, o que acabou resultando, no dia 28 daquele mesmo mês, na primeira grande paralisação dos metalúrgicos.
Nesse mesmo dia, as sedes dos Sindicatos iriam estar abertas para abrigar os operários da greve, no entanto, a Polícia Militar invadiu os locais e prendeu mais de 130 pessoas. Com a repressão da PM e a falta de apoio do próprio Sindicato, os grevistas foram obrigados a buscar abrigo dentro da Capela do Socorro, em São Paulo. Após dois dias de reclusão, Santo Dias decidiu ir até a frente da fábrica Sylvania e convocar seis mil operários que estavam começando o turno de trabalho da tarde. Assim que iniciou a discussão com os trabalhadores, a polícia militar chegou ao local. Os PMs agiram com violência para tentar conter os trabalhadores e, em meio a toda a confusão, Herculano Leonel atirou em Silva. O militante foi resgatado e levado ao hospital, mas já estava morto.
Julgamento
Após a morte de Santo Dias, sua família e amigos criaram o Comitê Santo Dias para tentar a condenação do PM responsável pelo tiro, Herculano Leonel.
O Comitê surtiu efeito. Em 1982, Leonel foi condenado a seis anos de prisão. No entanto, o policial militar recorreu da ação e o processo foi arquivado.
Caminhada
Até hoje, a luta de Santo Dias é lembrada com uma caminhada em sua homenagem. O percurso, que ocorre todos os anos desde a sua morte, é iniciado em frente à portaria do antigo prédio que ficava a fábrica Sylvania e vai até o cemitério de Campo Grande, onde Silva está enterrado. Durante o trajeto, as pessoas cantam músicas feitas para o militante metalúrgico.

Caminhada realizada em homenagem a Santo Dias. Fonte: Repórter Brasil
Santo Dias, inclusive, ganhou um álbum de músicas e depoimentos em homenagem a sua contribuição para os direitos dos trabalhadores. As músicas e as poesias que compõem o álbum foram feitas por trabalhadores. Luiz Augusto Passos também dedicou uma canção ao operário.
Clique na imagem para ter acesso ao álbum:

Álbum de músicas e depoimentos sobre Santo Dias da Silva. Fonte: Youtube.

Livro escrito por sua filha, Luciana Dias. Fonte: Repórter Brasil
Livros
A vida de Santo Dias da Silva serviu de inspiração para dois livros: Santo Dias. Quando o passado se transforma em história e Santo – dos nossos – Dias: fé política e compromisso social no cotidiano de luta de um operário na Paulicélia dos anos 70.
O primeiro foi escrito por sua filha, Luciana Dias, a jornalista Jô Azevedo e a fotógrafa Nair Benedicto; o segundo pelo escritor e educador Silvio Luiz Sant’Anna. Ambas foram lançadas em 2004.
Filme
A morte de Santo Dias também foi repercutida no filme Eles não usam Black-Tie, de 1981. O longa-metragem é baseado em uma peça teatral de mesmo nome e conta a história de um operário que resolve não participar de um movimento grevista liderado por seu pai. Preocupado com a gravidez de sua namorada, o trabalhador decide seguir trabalhando, dando início a um conflito familiar.
O filme, que começou a ser rodado após a morte de Santo Dias, tem uma das cenas finais baseada no episódio que tirou a vida do operário. A cena em questão é protagonizada pelo personagem Bráulio (Milton Gonçalves), que, em meio a um conflito com policiais militares, é acertado por um tiro fatal (parecendo-se com o acontecimento que resultou na morte de Silva).
Clique na imagem para assistir o filme:

Prêmio
Desde 1996, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de São Paulo realiza a entrega do Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos, que visa reconhecer o trabalho de pessoas e entidades em benefício dos direitos humanos. Os homenageados de 2014 foram o Padre Giuliani e o advogado Belisário dos Santos Jr.
Giuliani é italiano e há mais de 50 anos vive no Brasil. Durante a década de 70, liderou diversos movimentos populares, entre eles, o Movimento Custo de Vida e o Clube de Mães.
Já Belisário dos Santos é advogado, graduado pela Universidade de São Paulo (USP), com mestrado em Legislação Penal Especial, também pela USP, e especialista em direito administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC – SP). Santos é advogado militante desde 1970 e atualmente coordena o Programa de Direitos Humanos de São Paulo.
Por: Matheus Freitas
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